Estou ficando velho e de coração mole...
Eu explico. Provavelmente por causa das chuvas, um rato ou melhor, uma rata, pois era uma fêmea, saiu pelo ralo e se escondeu dentro do box, não utilizado, no banheiro. Foi presa ali, pela nossa ajudante Bete, até que eu chegasse e desse fim àquela horrenda criatura. Quando cheguei, prestes a dar cabo à vida da invasora, me tranquei no banheiro para evitar fugas e fui de vassoura em mãos para terminar logo o serviço. Abri a porta do Box e vi, ali, um ser amedrontado e sem saída, parecendo que já previa o seu trágico fim. Tinha ficado preso lá por horas, esperando a minha chegada e como uma condenada, já ciente da sua pena, não mostrou resistência, apenas aceitou seu destino. Olhei nos olhos dela e acabei baixando a vassoura, ela baixou os olhos e ficou esperando. Quando peguei a vassoura novamente, pensei, como está aí há horas, deve estar com fome. Como posso matar alguém com fome? Providenciei um amendoim que era da ração das aves e joguei pra ela. A rata se assustou com aquele objeto caindo perto dela, mas logo em seguida, com uma expressão de incredulidade, viu que era um alimento e, talvez pela fome ser maior que o medo, agarrou o amendoim e comeu vorazmente, como se fosse sua última refeição. Sentei-me no vaso e observando, comecei a pensar no que eu estava prestes a fazer; o bicho tinha fome e esse era, sem dúvida nenhuma, o motivo da invasão. Ainda com a expressão de desconfiança, ela me olhou, sem entender muito bem o que acontecia e eu, instintivamente, joguei outro amendoim para ela, que imediatamente aceitou. Saí do banheiro e fui até a cozinha buscar uma bolacha e voltei ao banheiro. Sentei no chão e ela ficou me olhando de cima em baixo. Quebrei a bolacha e joguei um pequeno pedaço na frente dela. Ela caminhou vagarosa e desconfiadamente se aproximou e pegou o pedaço de bolacha. Repeti essa conduta mais umas duas vezes e ela sempre se aproximando. Por fim, peguei um pedaço maior da bolacha, segurei entre os dedos e lhe ofereci. A ratinha, segundo minha mulher uma ratona, caminhou lentamente em direção à minha mão, com medo de mim e sentindo minha tensão pra não levar uma mordida, pegou gentilmente a bolacha e começou a comer, agora sem mais temor da minha presença ali. Neste momento acabou-se toda a minha vontade de exterminar aquela pobre criatura. Fiquei mais um tempo ali, admirando a resposta daquele animal ao tratamento gentil que dei a ela e como reagiu. Não sou filósofo, mas me coloquei a refletir sobre a forma como reagimos a situações conflituosas e principalmente quando nos armamos de puro preconceito para justificar nossas ações para com os outros. Aquele rato não deixou de ser um animal, considerado de risco à saúde, mas também não é diferente das centenas de outros, que atendo na clínica. Assim, tomando as medidas necessárias de segurança, acondicionei ela gentilmente em uma caixa e levei-a para um local mais adequado, fora da casa, onde poderia continuar sua rotina de roedor. Reforcei a vedação dos ralos e portas, assim, embora o nosso encontro tenha sido agradável, evitamos outros contratempos e situações que possam nos colocar novamente em trincheiras opostas.
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