14 de jul. de 2025

Israel usa veganismo para (tentar) lavar seus crimes

Eu nunca pensei que depois de quase 20 anos de veganismo eu me veria compelido a escrever um artigo sobre a instrumentalização do veganismo como arma narrativa por um dos países mais bélicos do mundo, um país com um sistema de apartheid e construído com terrorismo e limpeza étnica. 

Estou me referindo a 'israel' que, para limpar sua imagem perante o mundo e desumanizar o grupo humano o qual vitimiza, no caso os palestinos, se apropria do veganismo como parte de sua propaganda, que atualmente derrete mais rapidamente do que gelo no asfalto durante o verão carioca.

Mas aqui estamos, em 2025, tendo que denunciar isso porque, infelizmente, essa estratégia, assim como o pinkwashing, que é o uso de direitos LGBTQI+ para marketing identitário significante de 'civilização', é usada extensivamente e acaba seduzindo muita gente mal informada, preconceituosa e com uma visão embaçada e capitalista desses movimentos que tem como base a emancipação e expansão da consciência humana, e não maquiagem para crimes contra a humanidade.

Vamos começar com um dado importante: 'israel' está entre os cinco maiores consumidores per capita de carne. Esse dado deveria ser o suficiente para desmantelar qualquer propaganda de que se trata de um 'país vegano' como a propaganda sionista se esforça de espalhar por aí. Infelizmente muitos veganos que operam a partir de uma plataforma conceitual estreita e sem cultura política, acabam mordendo a isca, por ingenuidade ou preconceito mesmo.

Para criar essa imagem de paraíso vegano, 'israel' investe pesado em uma imagem de um país progressista, democrático e liberal (em contraste com os 'árabes bárbaros e medievais') e turnês pela paisagem culinária de 'israel', que na verdade é roubada dos árabes.

Como um projeto colonialista artificialmente criado pelo Ocidente em terras palestinas em 1948, 'israel' não tem história local; através da força bruta, destruiu as vilas palestinas, rebatizando-as com nomes hebreus e construindo cidades sobre as ossadas dos palestinos mortos nos muitos massacres feito durante os anos em que as forças sionistas começaram a aterrorizar a população local. 

A colônia sionista também se encarregou de se apropriar da cultura local, inclusive da culinária, para criar uma impressão de pertencimento a região e também para apagar o passado árabe. Limpeza étnica se faz também pela cultura, e não somente por corpos deslocados como acontece desde 1948, quando 700 mil palestinos foram expulsos de suas casas e se tornaram refugiados em sua própria terra (quando não assassinados).

Em uma jogada ainda mais depravada, alguns atrás as forças de ocupação (IDF), que surgiram a partir de uma milícia terrorista chamada Hagana, e cujo modus operandi inclui atirar em crianças e torturar civis palestinos, tentou emplacar o slogan de o 'exército mais vegano' do mundo por fornecer botas de couro sintético aos soldados que se declaram veganos. A hipocrisia seria risível se não fosse tão cruel: soldados que matam seres humanos se dizem veganos por usar botas de couro sintético 'sem crueldade'. 

Recentemente eu participei de uma discussão em um um thread no Facebook onde ativistas veganos questionavam as produtoras americanas de um conhecido podcast de direitos animais. Elas estavam sendo questionadas por entrevistar um influenciador vegano israelense. Esse influenciador se gaba em suas páginas nas redes sociais de ter alimentado soldados do IDF com comida vegana para que eles não tivessem o desprazer de comer algo não-vegano enquanto matavam crianças palestinas. Isso aconteceu em novembro de 2023, quando o genocídio já estava em curso e hospitais sendo bombardeados. É um situação tão absurda e bizarra que nem na esfera da paródia isso seria crível. Mas em se tratando da entidade sionazista, a imaginação perversa não conhece limites.

Aqueles que acreditam que um país fascista que opera um sistema apartheid pode ser oficialmente vegano, um 'paraíso vegano' ou que é um membro de forças de ocupação podem ser veganos simplesmente por usar botas sintéticas, não entenderam nada sobre o veganismo como ele foi manifestado por Donaldo Watson em 1944.

O veganismo advoga a libertação e o respeito por todos os seres sencientes, não-humanos e humanos também. É impossível separar a luta por direitos humanos da luta dos direitos animais porque ela faz parte do mesmo movimento por justiça e reconhecimento de direitos. Aqui vale lembrar que para justificar a matança de seres humanos, tanto no caso de Gaza como no caso de outros genocídios, o lado que executa a violência sempre recorre ao uso de linguagem de desumanização do grupo alvo, comparando-os a animais. O consentimento de violência contra humanos é manufaturado pela violência institucionalizada contra os animais não-humanos.

No caso de Gaza, essa linguagem foi usada explicitamente quando Israel anunciou claramente que iria cometer genocídio contra a população Palestina em Gaza em outubro de 2023. “Estamos lutando contra animais humanos”. Foi assim que o Ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, anunciou o que chamou de “cerco total” a Gaza, após um ataque surpresa do Hamas contra Israel. Gallant anunciou inclusive crimes de guerra como o corte de comida, água e produtos médicos. É o primeiro caso onde um estado genocida anuncia o genocídio.

O fato de muitas organizações veganas e de direitos animais de grande alcance terem escolhido ficar silenciosas, e portanto, em posição de cumplicidade, com o genocídio feito por Israel contra os palestinos demonstra que elas tem uma visão embaçada, equivocada ou racista do que é o veganismo.  A outra hipótese é que essas organizações não querem se indispor com seus financiadores e patrocinadores, ou seja, abraçaram a lógica capitalista para o qual um genocídio pode ser relativizado ou simplesmente ignorado (além disso, muita gente se beneficia financeiramente do genocídio, como o relatório da rapporteur das Nações Unidas, Francesca Albanese, demonstra).

Somado a tudo isso, existe a questão dos animais não-humanos que também morrem e sofrem no genocídio. Em Gaza, que tem uma grande população de gatos e também de cães, os animais tem morrido sob as bombas, escombros, de doenças, da violência dos terroristas israelenses que brincam de tiro ao alvo com animais, além do pânico e estresse de estar em uma zona de violência extrema. Apenas uma organização, a Sulala, ainda opera na região. E apenas a Animals Australia e outras organizações menores tem ajudado a Sulala. Organizações mainstream e com suporte corporativo têm permanecido conspicuamente silenciosas sobre Gaza.

O silêncio sobre Gaza é uma traição e sabotagem do veganismo. Ao admitir que o assassinato de crianças e adultos inocentes em massa é algo aceitável ou que possa ser relativizado, os grupos de direitos animais admitem a derrota do veganismo. Se em um mundo antropocêntrico, matar crianças é normalizado, ignorado e relativizado, o que será dos animais não humanos em matadouros e outros lugares horríveis e cruéis onde as dores mais excruciantes são infligidas nos corpos desses seres sencientes tratados como produtos?

Em 2025, não é possível ser vegano sem ser pró-Palestina, não é possível ser ignorante sobre as mentiras de 'israel' e seu uso do veganismo para acobertar seus crimes e limpar a sua imagem e, acima de tudo, acreditar que o veganismo acontecerá pelas mãos do capitalismo. Pelo contrário, o capitalismo corrói o princípio vegano, cria falsas soluções e destrói o planeta, lar de todos nós animais.

Nada mais não-vegano do que capitalismo e Israel, a expressão mais sórdida, sádica e violenta do colonialismo e supremacia.

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